Com o desenvolvimento das civilizações e das cidades, cada vez mais a sociedade produz e descobre novos meios de produção, produtos e meios de gerar bens econômicos. A geologia sempre esteve intimamente ligada à economia em escala global, pois é por meio dela que se obtêm substâncias de grande valor monetário como os metais preciosos, diamantes, etc.
Contudo com o crescimento e diversificação das metrópoles e indústrias, alguns ramos, ainda que sutis, surgiram junto, como os estudos voltados a área de meio ambiente à contaminação do solo e das águas subterrâneas e o impacto associado à saúde humana e dos ecossistemas.
Temáticas como esta não tiveram a mesma valorização e atenção durante esta ascensão das grandes fábricas e linhas de produção, seja tanto em âmbito internacional como nacional, seja por falta de conhecimento à época, investimento ou até mesmo negligência.
A partir de estudos pioneiros como o livro Primavera Silenciosa de Rachel Carson e casos emblemáticos, iniciou-se então uma onda de movimentos, pesquisas e desenvolvimento por parte governamental para se compreender como se dava a contaminação nas diferentes matrizes ambientais e o impacto causado aos seres vivos, buscando regulamentar e integrar todas as ciências que são envolvidas nestes estudos.
Como foi dito, a geologia é facilmente associada a obtenção de bens econômicos, mas aqui neste conteúdo iremos mostrar que esta ciência constitui notória importância no entendimento de investigações ambientais relacionadas a contaminações. No conteúdo é discutido como se dá uma contaminação, como estas interagem com o meio geológico, formas de investigação e aspectos legais.
Fontes de contaminação
O início de um processo de investigação ambiental com foco na identificação de uma possível contaminação se dá pelo levantamento de diversas informações. Estes dados envolvem primeiramente o reconhecimento das fontes de contaminação, como tanques enterrados (fonte pontual) (Figura 1) ou uma área de disposição de resíduos (fonte difusa) , sejam elas atuais ou pretéritas, o que influenciará diretamente na abordagem que será utilizada para investigação.
Consolidadas as fontes de contaminação que existem na área estudada, é mandatório levantar dados sobre a geologia e hidrogeologia, bem como os tipos de solo que podem ocorrer no local pois, são estas característica que irão governar a maneira com que os contaminantes irão adentrar no meio natural, se mobilizar e serem transportados.
É válido lembrar também que a depender dos tipos de rochas e solos de uma dada região, alguns compostos inorgânicos como os metais, podem ocorrer a níveis acima dos padrões e caberá a investigação relacionar estes à ocorrências regionais descaracterizando uma possível contaminação.
Na Tabela 1 são ilustrados os diversos ambientes e atividades que corriqueiramente geram contaminações com as fontes e os principais grupos de contaminantes associados.
Tabela 1 – Atividades potencialmente geradoras de áreas contaminadas
Figura 1 – Instalação de tanques subterrâneos
Geoquímica e transporte das substâncias em subsuperfície
Tratando-se dos contaminantes relacionados a compostos orgânicos, de modo geral, ao adentrarem no meio subterrâneo, podem ser encontrados de 4 formas:
- Fase líquida não aquosa (produto que vazou)
- Fase residual (produto adsorvido/residual no solo)
- Fase dissolvida (produto solubilizado na água)
- Fase vapor/gasosa (produto volatilizado)
A taxa com que um contaminante apresenta de particionar de uma fase para outra dependerá de suas propriedades intrínsecas (solubilidade, características físico-químicas, volatilidade, etc) e das propriedades do meio natural (teor de matéria orgânica no solo, porosidade, permeabilidade, granulometria, etc).
Vale lembrar que para a fase líquida não aquosa existem duas formas distintas baseadas em diferenças de densidade. Quando menos densa que a água é chamada de fase líquida não-aquosa leve ou LNAPL (do inglês, light non-aqueous phase liquid) representada pelos hidrocarbonetos de petróleo, e quando mais densa é chamada de fase líquida não-aquosa densa ou DNAPL (do inglês, dense non-aqueous phase liquid) classe que abrange os compostos organoclorados.
Na figura 2 são ilustradas as diferentes fases dos contaminantes e do comportamento em subsuperfície.
Figura 2 – Diagrama esquemático de vazamento de produtos no meio subterrâneo
Neste sentido, como mostrado na ilustração acima, é de extrema relevância entender como são e como estão organizados os substratos geológicos e hidrogeológicos, na área de estudo.
Conforme ilustrado na Figura-3, distinguir e entender os compartimentos e zonas que existem em subsuperfície , definir o tipo de aquífero que ocorre no local, bem como a presença de aquicludes e aquitardos/es é fundamental para compreender a partição e transporte dos contaminantes, além de tomar amostras representativas durante os estudos ambientais.
Figura 3 – Representação esquemática da distribuição vertical da água no solo e no meio subterrâneo
A respeito do transporte, o conhecimento das propriedades hidrogeológicas do local, tais como condutividade hidráulica, gradiente hidráulico, porosidade efetiva entre outros parâmetros é fundamental para se conhecer a velocidade com que os contaminantes estão migrando. Somados a outros dados, estas informações auxiliam no entendimento da dispersão, retardação e degradação das plumas de contaminação em água subterrânea.
Técnicas de investigação
Atualmente existem diversas formas de investigação tratando-se da obtenção de dados de subsuperfície. O uso das diferentes ferramentas dependerá do entendimento das características locais, da etapa de estudo executada, do nível de detalhamento necessário e também pelas características do meio físico da área em estudo. Dentre as técnicas, é possível agregá-las em três grupos:
- Técnicas indiretas ou tipo varredura (screening)
- Métodos geofísicos
- Métodos probabilísticos
- Amostragem passiva
- XRF (Fluorescência de raios X) (Figura 4)
- Técnicas diretas (tradicionais)
- Sondagens ambientais (manuais ou mecanizadas) (Figura 5)
- Poços de monitoramento de água subterrânea e ar do solo
- Amostragem de águas subterrâneas, superficiais, de sedimentos e de ar do solo e ambiente
- Técnicas de alta resolução
- MIP (Sonda de interface com membrana e condutividade elétrica)
- RCPTu (Ensaio de penetração de cone com medida de poro-pressão e resistividade)
- HPT (Ferramenta para perfilação hidráulica)
Figura 4 – Utilização de dispositivo de fluorescência de raios x (XRF) para avaliação de teor de metais no solo em campo
Figura 5 – Execução de sondagem mecanizada revestida com cravação de testemunhos de solo com amostradores descartáveis (liners) para investigação de compostos voláteis
Para se ter um robusto entendimento de uma contaminação, independente do método de investigação utilizado ou então do objetivo da investigação, é preciso construir um forte embasamento das características geológicas e hidrogeológicas do local, a partir dos dados coletados em campo junto ao levantamento bibliográfico.
Tais características além disso, são mandatórias tratando-se de aspectos legais, abordados a seguir.
Aspectos legais
Sob a perspectiva do âmbito legal, no Brasil existem resoluções, leis e decretos que estabelecem ou indicam os procedimentos para investigação e reabilitação de áreas contaminadas.
Estes procedimentos possuem caráter nacional, à exemplo do CONAMA, mas existem também decretos e instruções estabelecidas pelo órgão ambiental de cada estado, representado pela CETESB em São Paulo.
Estes documentos mencionam todos os itens a serem levantados, as matrizes investigadas, quais dados devem ser apresentados e também indicam os valores padrões e comparativos de substâncias químicas que balizam a constatação ou ausência de contaminações.
Abaixo são discriminadas algumas diretrizes e padrões comparativos utilizados nas investigações de áreas contaminadas no Brasil:
- CONAMA 420/ 2009 e normas da ABNT (Nacional)
- Lei 13577/2009, Decreto 59263/2013, Decisão de Diretoria 038/2017 da CETESB (São Paulo);
- Deliberação Normativa Conjunta COPAM/CERH nº 02/2010 e Deliberação Normativa COPAM nº 166/2011 associados a FEAM (Minas Gerais);
- Portaria 085/2014 da FEPAM (Rio Grande do Sul);
- INEA (Rio de Janeiro)
Independente do local onde os estudos são realizados, bem como a lei a ser cumprida, o objetivo final sempre é a reabilitação da área contaminada levando em conta o uso que se pretende. O processo de gerenciamento comumente pode demandar a necessidade de medidas de remediação no local contaminado, dada a complexidade e vastidão do assunto, trataremos em outro conteúdo separadamente.
Como foi demonstrado, o processo de gerenciamento de uma área contaminada é complexo e moroso, haja vista a complexidade dos assuntos envolvidos, podendo levar anos até que encerre um caso tornando a área reabilitada. Agora conhecido o papel indispensável da geologia na execução deste tipo de estudo, convidamos você a conhecer esta área de atuação da geologia e a comentar o que achou de mais interessante sobre o tema, além disso, abaixo separamos leituras para conhecer mais sobre o assunto!
Leituras e conteúdos para conhecer um pouco mais sobre o tema:
Canal ECD Training no Youtube
Livro:
Hidrogeologia: Conceitos e aplicações
Site:
Recuperação de Áreas Contaminadas — Português (Brasil) (www.gov.br)
Site:
Referências Utilizadas:
BERTOLO, R., ALVES, C. C., MAXIMIANO, A. Áreas Contaminadas. In: OLIVEIRA, A. M. S., MONTICELI, J. J. (eds.). Geologia de Engenharia e Ambiental. São Paulo: ABGE, 2018. v. 3, cap. 35, p. 63-87.
FEITOSA, F. A. C. (Coord.) et al. Hidrogeologia: conceitos e aplicações. 3 ed., rev. e ampl. Rio de Janeiro: CPRM; Recife: LABHID, 2008. 812 p. il., color. ISBN 9788574990613.
ADNORMAS. O ensaio de estanqueidade no armazenamento subterrâneo de combustíveis. 2020. Disponível em: https://revistaadnormas.com.br/2020/02/04/o-ensaio-de-estanqueidade-no-armazenamento-subterraneo-de-combustiveis. Acesso em: 19 jan. 2023.