Estromatólitos: as formas de vida mais antigas da Terra

Estromatólitos: as formas de vida mais antigas da Terra

Do grego, stroma, que significa “camada”, e lithos, que significa “rocha”, este termo cunhado pelos pesquisadores dá o nome a essas peculiares e mais antigas formas de vidas já encontradas na natureza. Remetendo ao passado do planeta Terra, os estromatólitos possuem um papel singular na história do nosso planeta.

De acender uma fogueira a formação de grandes depósitos minerais de ferro, da fagulha inicial que teria originado as primeiras formas de vida microscópicas a rochas com reservas de petróleo, os estromatólitos possuem vasta importância para a ciência e para o modo de vida dos seres que habitam a Terra.

Confira no texto abaixo como são formados, como é o desenvolvimento e a influência dos estromatólitos no planeta Terra.

Origem e formação dos Estromatólitos

Os estromatólitos, um tipo de microbialito, são produtos de uma associação microbiana e sedimentar (biossedimentar). Em síntese, sua origem se dá pela deposição de finas camadas de cianobactérias, bactérias fotossintetizantes, e posterior fixação e cimentação de camadas de carbonato de cálcio associado ao ambiente de formação e ao processo de fotossíntese realizado por estes microrganismos (WINGE et al., 2021).

Como mostrado em escala microscópica de modo esquemático (Figura 1), estas estruturas acabam formando uma grande sucessão de camadas, ora de filamentos microbianos, ora de sedimentos carbonáticos, desenvolvendo diferentes formas ou bioconstruções (Sallun Filho, 1999).

Figura 1 – Ilustração esquemática das camadas de um estromatólito. Fonte: Knoow.net (2018).

A partir da datação de rochas que continham traços destes filamentos microbianos preservados (Figura 2), verificou-se que os registros indicam uma idade de 3,5 bilhões de anos (MORRISON, 2002). Esta idade confere a estas associações biossedimentares um caráter único, pois correspondem aos primórdios da vida que se conhece no planeta Terra.

Figura 2 – Filamento microbiano encontrado em rocha datada de 3.5 bilhões de anos. Fonte: Evosite.ib.usp.br (2006).

Morfologia

Como mencionado, os estromatólitos podem ocorrer e se desenvolver de diferentes formas, a depender dos fatores ambientais onde se localizam. Na Figura 3, são mostradas as morfologias típicas relacionadas a cada ambiente sedimentar.

Figura 3 – Morfologia dos estromatólitos em função do ambiente sedimentar. Fonte: Romero (2015). 

Em relação ao ambiente, os fatores que notadamente influenciavam sua morfologia seriam principalmente o grau de agitação da água, correntes, profundidade, tipo de substrato local, temperatura da água, salinidade, luminosidade e exposição sub-aérea. Quanto aos fatores biológicos, vale ressaltar a taxa de crescimento, composição taxonômica, o hábito de crescimento, decomposição e destruição causada por outros organismos (SALLUN FILHO, 1999).

Desta maneira, verifica-se que os estromatólitos se estabeleceram e também ocorrem sob condições específicas, e por vezes somente em ambientes favoráveis a sua formação. Na Figura 4 é ilustrada uma tabela onde a morfologia dos estromatólitos permite a interpretação dos paleoambientes de formação em um estudo desenvolvido no Canadá.

Figura 4 – Interpretação paleoambiental a partir de diferentes tipos de estromatólitos e estruturas sedimentares associadas ao grupo Dismal Lake, Canadá . Fonte: Donaldson, (1976) apud Sallun Filho, (1999).

Como o registro fóssil destas estruturas é vasto, para ilustrar um pouco do que se encontra em diferentes rochas e períodos geológicos,  na Figura 5 é ilustrado um afloramento de estromatólitos cambrianos na região de Nova York (EUA).

Figura 5 – Estromatólitos presentes no lamito Hoyt, exposto no Parque Lester, próximo a Saratoga Spring, Nova York (EUA). A escala posicionada na fotografia possui 3 cm. Fonte: Fotografia de Michael C. Rygel (2005).

Importância científica

Tendo em vista que os estromatólitos envolvem conceitos relacionados a geologia e biologia, o desenvolvimento de estudos destas formações permite adquirir dados de diversas áreas conforme ilustrado na Figura 6.

Figura 6 – Relações dos estudos de estromatólitos e suas aplicações envolvidas. Fonte: Hofmann, (1973) apud Sallun Filho, (1999).

Como mencionado, estudos indicam que estes seres possuem grande proximidade com os primeiros organismos que surgiram na Terra (SCHOPF, 1994), mas além disso possuem fortes correlações ao enriquecimento da atmosfera em oxigênio, estando fortemente associados ao marco intitulado de Grande Evento de Oxigenação (GOE, sigla em inglês) junto ao vulcanismo que ocorria à época (ROMERO, 2015).

A Figura 7 apresenta uma ideia de como imagina-se que eram os ambientes de formação e a superfície terrestre antes da adição substancial de oxigênio na atmosfera.

Figura 7 – Representação gráfica do ambiente de desenvolvimento dos estromatólitos em atmosfera pobre em oxigênio. Fonte: BBC News Brasil (2016). 

Pesquisas indicam que a dominância e atuação das cianobactérias que compunham as estruturas estromatolíticas corroboraram ainda para a formação das chamadas Formações Ferríferas Bandadas ou BIF (Banded Iron Formations em inglês) tal como discutido por Konhauser et al., (2011), metal imprescindível para o desenvolvimento das civilizações.

Ocorrências brasileiras

No Livro Geologia do Continente Sul-Americano: Evolução da obra de Fernando Flávio Marques de Almeida, Fairchild & Sallun Filho (2004), levanta um rico histórico do estudo de estromatólitos em terras sul americanas e dos trabalhos desenvolvidos pelo autor contido no título da obra, que vinha pesquisando sobre esta temática desde 1944.

Os estudos de F. F. M. Almeida registraram a ocorrência de estromatólitos em diversas terras brasileiras oriundas de diferentes períodos geológicos. 

Foram verificadas notórias ocorrências na Formação Estrada Nova em Alto Araguaia (MT), Grupo Açungui e Grupo Itaiacoca (PR), Formação Bocaina, Corumbá (MS), Formação Araras em Rosário Oeste (MT), Faixa Ribeira (SP), entre outras (FAIRCHILD & SALLUN FILHO, 2004).

Romero (2015) enriquece a literatura de registros brasileiros de estromatólitos ressaltante as ocorrências em Vazante e Lagamar (MG), Cabeceiras (GO), Formação Irati, Corumbataí e Estrada Nova na Bacia do Paraná, além de ressaltar também os registros na Bacia de Campos e Potiguar.

Visando a conservação e preservação destas majestosas ocorrências, a SIGEP (Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleobiológicos) tem tomado iniciativas para englobar estes afloramentos em Geossítios. Abaixo na Figura 8, é possível visualizar um afloramento do Sítio Fazenda Recife no estado da Bahia.

Figura 8 – Vista em corte de Estromatólitos colunares ramificados. Fonte: Extraído de Schobbenhaus (2002).

Representantes atuais

Como abordado acima, no decorrer do tempo geológico foram verificadas diversas ocorrências de estromatólitos preservados em rochas em diferentes formações geológicas no planeta. Estas ocorrências se iniciam no período Pré-Cambriano, possuem alguns picos de grande ocorrência em certas momentos da história da Terra, mas curiosamente ainda podem ser encontrados na atualidade.

Devido às condições restritas necessárias ao seu desenvolvimento, na época atual são poucos os locais onde estas estruturas biossedimentares conseguem se adaptar e desenvolver. De acordo Romero (2015) dentre as localidades onde já foram verificados estromatólitos modernos pode-se elencar:

Figura 9 – Fotografia de estromatólitos atuais na localidade de Hamelin Pool, oeste da Austrália. Fonte: Bushheritage.org.au (2022). 
Figura 10 – Fotografia de estromatólitos do tipo dômicos atuais, localizados na Lagoa Salgada, Rio de Janeiro (Brasil). Fonte: Geoparquecostoeselagunas.com (2018). 

Os estromatólitos de fato trazem informações muito ricas e interessantes de vida e do ambiente de um passado por vezes distante. São diversas implicações que decorrem da formação, influência e presença destas estruturas no registro fóssil brasileiro e mundial.

Gostou desse conteúdo? Se encontrar alguma estrutura como essas no campo, suspeite, podem ser Estromatólitos! Compartilhe para que mais pessoas fiquem sabendo sobre as geociências!


Para ver um pouco sobre os seres vivos mais antigos que já existiram, deixamos alguns conteúdos extras aqui:

Canal Jamie Foster 

Canal Jamie Foster https://www.youtube.com/watch?v=N-G7IJCkyvg

Site BBC

https://www.bbc.com/travel/article/20210117-stromatolites-the-earths-oldest-living-lifeforms

Referências Consultadas:

ESTADO DE MINAS. Estromatólitos: como a forma de vida mais antiga conhecida ajudou a tornar a Terra habitável. 2021. Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/ciencia/2021/03/05/interna_ciencia,1243770/estromatolitos-como-a-forma-de-vida-mais-antiga-conhecida-ajudou-a-tornar.shtml. Acesso em: 4 set. 2022.

Referências Utilizadas:

BUSH HERITAGE AUSTRALIA. Stromatolites. 2022. Disponível em: https://www.bushheritage.org.au/species/stromatolites. Acesso em: 8 set. 2022.

BBC NEWS BRASIL. Como surgiu o oxigênio na Terra? Ciência busca pistas de ‘evento-chave’. 2016. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/01/160104_vert_earth_oxigenio_origem_fd. Acesso em: 4 set. 2022.

ENTENDENDO A EVOLUÇÃO. De Sopa a células – A Origem da Vida. Disponível em: https://evosite.ib.usp.br/evo101/IIE2aOriginoflife.shtml. Acesso em: 4 set. 2022.

FAIRCHILD, T. R., SALLUN FILHO, W. 2004. Collenia Itapevensis, o primeiro fóssil pré-cambriano brasileiro e sua importância no estudo de estromatólitos do Brasil. In: MANTESSO-NETO, V. BARTORELLI, A. CARNEIRO, C. R. BRITO-NEVES, B. B. 2004. Geologia do Continente Sul-Americano: Evolução da Obra de Fernando Flávio Marques de Almeida. São Paulo: Beca, 177-186p.

GEOPARQUECOSTOESELAGUNAS. Estromatólitos da Lagoa Salgada, Livreto 2: Estromatólitos da Lagoa Salgada vida produzindo rocha. 2018. Disponível em: https://www.geoparquecostoeselagunas.com/estromatolitos-da-lagoa-salgada/. Acesso em: 9 set. 2022.

MORRISON, R. Australia Land Beyond Time: The 4-billion-year Journey of a Continent. 2002. Austrália: Reed New Holland, 334 p.

KNOW.NET. Estromatólitos. 2018. Disponível em: https://knoow.net/ciencterravida/biologia/estromatolitos/. Acesso em: 4 set. 2022.

KONHAUSER, K. et al. Aerobic bacterial pyrite oxidation and acid rock drainage during the Great Oxidation Event. Nature 478, 369–373 (2011). Disponível em: https://www.nature.com/articles/nature10511#change-history. Acesso em: 6 set. 2022.

ROMERO, G. R. 2015. Geobiologia de microbialitos do Ediacarano da Faixa Paraguai e do sul do Cráton Amazônico (MS e MT): implicações paleoambientais, paleoecológicas e estratigráficas. Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo, São Paulo. Tese de Doutorado, 101 pp. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/44/44141/tde-24022016-095246/pt-br.php.

SALLUN FILHO, W. 1999. Análise dos estromatólitos do Grupo Itaiococa (Proterozóico), ao sul de Itapeva, SP. Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo, São Paulo. Dissertação de Mestrado, 115 pp.  Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/44/44136/tde-10052010-165919/pt-br.php

SCHOBBENHAUS, C., CAMPOS, D.A., QUEIROZ, E.T., WINGE ,M.,  BERBERT-BORN, ,M.L.C. (Edit.) 2002. Sítios Geológicos e Paleontológicos do Brasil. DNPM/CPRM – Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleobiológicos (SIGEP) – Brasília 2002; 554pp; ilust. Disponível em: http://sigep.cprm.gov.br/sitios.htm. Acesso em: 7 set. 2022.

SCHOPF, J.W. 1994. The oldest known records of life: Early Archean stromatolites, microfossils, and organic matter. In: BENGTSON, S. (ed.). Early life on Earth. New York: Columbia University Press, p. 193-206.

WINGE, M. et al. Glossário Geológico Ilustrado. 2021. Disponível em: http://sigep.cprm.gov.br/glossario/index.html. Acesso em: 6 set. 2022.

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